Website: fitlifebrands.com
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Bom dia, família!
Turnarounds são fascinantes casos de observação. Não importa se falamos de pessoas ou de empresas, o enredo começa sempre do mesmo jeito. É alguém que se afundou porque passou muito tempo fazendo muita coisa errada. Tudo segue péssimo até que um belo dia esse alguém resolve que vai melhorar. O problema é que, pra melhorar, ele precisa fazer as coisas certas. Ou seja, ele tem que começar a fazer tudo o que ele nunca fez.
Esse processo me lembra um velho episódio de Seinfeld chamado “The Opposite”:
“Se todo instinto que você tem é errado, então o oposto tem que ser o certo”, Jerry Seinfeld
O conselho de Jerry é lógico mas o problema da lógica é que sua aplicação prática por vezes esbarra nas complexidades da vida real. O certo é ainda mais difícil para quem sempre fez o errado. Não é como em um sitcom americano, onde o personagem pode transformar seus vícios em virtudes em um piscar de olhos. Turnarounds são verdadeiras batalhas de superação.
Como tanta gente, eu também gosto de ver batalhas de superação. Acompanhar a luta de alguém contra si mesmo na busca por redenção traz certo envolvimento emocional. Eu sempre torço pela superação. Torço quando falamos de pessoas e torço quando falamos de empresas. Existe, contudo, uma diferença: as empresas podem trocar quem está no comando. É uma diferença e tanto.
É verdade que existe pouco o que um operador possa fazer para criar prosperidade em um negócio irrecuperável. Mas as coisas são diferentes quando a dinâmica do negócio não é assim tão ruim e o problema maior está no operador. Ao invés de esperar que a redenção do negócio venha pela redenção do operador, o investidor pode viver a redenção do negócio pela substituição do operador. Ou seja, pela chegada de um novo comandante que já tenha os instintos certos.
Esse é nosso caso de hoje, porque foi assim que a FitLife Brands viveu sua redenção. Pela chegada de Dayton Judd, um CEO de bons instintos.
A FITLIFE BRANDS
A FitLife Brands é uma empresa com sede em Omaha que desenvolve e comercializa suplementos nutricionais. Com apenas $100 milhões de valor de mercado, essa small-cap tem entre suas marcas a NDS Nutrition, PMD Sports, SirenLabs, Nutrology e iSatori.
O mercado de suplementos não é dos mais fáceis. As empresas precisam seguir um grande número de regulamentações e boa parte dos produtos possuem limitado estudo clínico comprovando benefícios. Pra piorar, existe uma intensa competição. O número de produtos e fabricantes é enorme. Eu até não sou dos mais pessimistas, no sentido de que acho que existe certa lealdade aos produtos e marcas. Mas seja como for, não é um negócio fácil.
A antiga gestão da FitLife Brands transformou o que não é um negócio fácil em uma catástrofe. Trimestre a trimestre de sucessivas quedas de receita e prejuízos no bottom-line. Teve também o velho clássico de tentar se salvar com aquisição ruim. Financeiramente, a empresa acabou estrangulada. Atrasou pagamentos a fornecedores e deu default em dívida. Foi no meio desse caos que Dayton Judd assumiu a empresa, no início de 2018.
Contador de formação, Judd tem um currículo com o pedigree da dobradinha HBS/McKinsey. Depois disso, foi portfólio manager de um hedge fund chamado Q Investments até finalmente ir fundar sua firma de investimentos Sudbury Capital Management.
O universo de smallcaps globais é um universo peculiar. Não é raro vermos um mesmo nome pipocando em várias smallcaps diferentes. O camarada entra em um conselho aqui, assume interinamente ali, aumenta uma participação acolá. Quando o camarada é bom, vale a pena acompanhar seus movimentos nas small-caps porque ele pode ser o gatilho de um ponto de inflexão. Dayton Judd é um desses nomes, com atuação em outras smallcaps como Otelco, RLJ Entertainment e Optex Systems.
O interesse de Judd por microcaps acabou desembocando na FitLife Brands. Ele montou boa posição na empresa, entrou pro board em 2017 e assumiu como CEO em 2018. Desde então, aumentou sua posição e hoje possui mais de 50% das ações. Se você quiser ficar confortável com a FTLF, você vai precisar ficar confortável com Dayton Judd.
Como vamos ver, não é difícil ficar confortável com Dayton Judd. Ele assumiu a FitLife Brands e tratou logo de recapitalizar a companhia e reestruturar as dívidas. A estratégia inicial passou por aumentar a venda on-line e investir em novos produtos. As mudanças deram resultados:
A FitLife Brands recuperou a boa dinâmica nas receitas. Uma das razões foi o crescimento do e-commerce, que era um canal quase inexistente. A decisão estratégica de investir no online veio antes da pandemia e, entre os objetivos, estava melhorar as margens e ser menos dependente da GNC. Este último, um ponto que merece atenção.
A GNC é um dos maiores vendedores de suplementos dos Estados Unidos e o maior distribuidor dos produtos da FitLife Brands. Em 2017, a GNC foi responsável por nada menos do que 80% da receita da FitLife. É uma concentração de dar frio na barriga. Apesar disso, a FitLife passou por um teste de fogo quando a GNC entrou em processo de falência no meio da pandemia e fechou boa parte das suas lojas. A Fitlife se manteve de pé e o volume de vendas com a GNC não sofreu tanto. Uma resiliência, com certeza. Mas que não apaga o risco de concentração. Um risco que Judd tratou de mitigar aos poucos:
Um segundo vetor do crescimento de receita foi o constante lançamento de produtos em um mercado ávido por novidades. Entre lançamentos e novas fórmulas, foram 18 produtos em 2018, 11 em 2019, 32 em 2020, 15 em 2021 e 10 em 2022. O investimento em novos produtos também foi parte do planejamento inicial de Judd ao assumir a FitLife Brands.
Por último e não menos importante temos as aquisições. A FitLife Brands não é uma serial acquirer mas começa agora a ser mais agressiva nesse departamento. Dayton Judd esperou ajustar as finanças e estabilizar a operação da FitLife antes de olhar para alvos potenciais. A primeira aquisição veio só em 2021 quando a FitLife comprou a Nutrology, uma marca de suplementos veganos, por modestos $529,000.
Já a segunda compra veio no fim de 2022 e foi um belo salto. A FitLife concordou em pagar $17 milhões na canadense Mimi’s Rock (TSX: MIMI). A compra foi feita em dinheiro, seguindo a política de Judd de fazer aquisições priorizando o uso de cash ao invés de equity. Esse respeito ao equity como moeda costuma ser bom indicativo. Enfim, pra financiar a aquisição a FitLife levantou cerca de $12.5 milhões em novas dívidas. É o maior nível de dívida desde que Judd assumiu, mas um montante bem administrável cuja expectativa é de estar zerado em 12 meses.
A terceira e mais recente aquisição aconteceu há pouco tempo. No fim de setembro, a FitLife anunciou a compra dos ativos da MusclePharm pelo valor de $18.5 milhões. Mais uma vez, tudo em cash. O perfil das duas últimas aquisições indicam o novo caminho que a FitLife vai seguir. Tanto a Mimi’s Rock quanto a MusclePharm estavam em dificuldades. No caso da MusclePharm, a empresa que chegou a ter Arnold Schwarzenegger e Tiger Woods promovendo seus produtos já estava inclusive no meio do seu processo de falência. Apesar disso, as duas empresas possuem marcas de suplemento conhecidas.
O trabalho inicial de recuperar a própria FitLife já passou. Agora, de posse de um balanço forte e gerando caixa, a atenção de Judd está em pagar barato por ativos de empresas em dificuldade. Mas não qualquer ativo. Conforme dito em uma apresentação antiga, a política de aquisição da FitLife é:
Adquirir marcas que competem em categorias complementares, atingir novas demografias, ou proporcionar oportunidades incrementais de e-commerce
Sempre que possível, utilizar dinheiro ao invés de equity para as aquisições
Priorizar aquisições de impacto imediato para os lucros
Reduzir a dependência da GNC
As últimas aquisições da FitLife respeitaram o prometido. O % de vendas via GNC saiu de 67% no fim de 2022 para atuais 37%. Já a contribuição do online saiu de 28% das receitas em 2022 para atuais 59%. A integração da Mimi’s Rock aconteceu rápido e o mesmo espera-se da MusclePharm. Como os ativos são comprados de empresas em dificuldade, existe aí um alto potencial de melhoria operacional. Embora a indústria de suplementos nutricionais não seja fácil, me parece que um grande número de pequenas empresas do setor não são bem administradas. Isso dá margem de roll-up para um grande operador. O fato de que Dayton Judd tem muito skin in the game, é um sujeito com claro entendimento de alocação de capital e já passou por um bem sucedido processo de turnaround no setor trazem confiança pra tese.
Cherry on top, o preço não é mau. Considerando as últimas aquisições, a FitLife Brands hoje está sendo negociada por ~7x NTM EBITDA. A fim de ganhar visibilidade e aumentar a liquidez, a empresa conseguiu um uplist. Com isso, saiu da OTC Pink e foi pra Nasdaq. Uma aprovação bem recente, de setembro apenas.
Antes que me acusem de florear, vamos deixar algumas coisas claras: o setor é muito competitivo, os produtos são um pouco comoditizados, o papel ainda é iliquido, a GNC ainda é representativa e Dayton Judd concentra muito poder. Esses são alguns dos riscos. Além deles existe uma outra situação que vale comentar, que é a mudança da tese.
Qando um investidor olha pro histórico de execução e valorização da FitLife Brands, a chance é grande de crescer os olhos. O turnaround que vocês acabaram de ler se traduziu em uma valorização de - pasmem - 86% a.a. nos últimos 5 anos. É por isso que gosto de seguir alguns nomes do universo de smallcaps e é por isso que gosto de inflexões. Mas sejamos honestos, essa é uma história que ficou pra trás.
A história que existe hoje é a de uma estável FitLife Brands que usa do seu balanço e da sua geração de caixa para fazer aquisições no setor de suplementos nutricionais. O legacy business já não cresce tanto assim. É uma empresa que, de certa forma, se graduou e mudou de fase. E será pela execução nessa nova fase que ela será recompensada a partir de agora. É por isso que o investidor tem que tomar cuidado pra não extrapolar o passado. Muitos elementos continuam os mesmos, mas o enredo agora é outro.
Uma boa semana e até a próxima!
Leo Caroli